SLA´s – tão necessários quanto inúteis
O título parece exagerado e sensacionalista, mas não consegui pensar em nada que se aproxime mais da realidade.
Todos querem SLA´s, mas poucos tem em mente objetivos claros antes de começar a construí-los.
O objetivo maior, é claro, não poderia ser outro a não ser o “alinhamento com o negócio”, uma das máximas mais exaustivamente repetidas e menos efetivamente implementadas. E o motivo é muito simples: não existe mágica para isso. Nem ITIL® nem qualquer sistema, metodologia ou melhor prática é capaz de fornecer a resposta definitiva de como obter o “alinhamento” com o negócio.
De fato, essa é uma pergunta aberta e que exige uma abordagem estruturada, que se inicia no entendimento dos objetivos de negócio e se replica em diferentes níveis. É impossível falar em “alinhamento” em um único nível. É mais coerente falar em uma “cadeia de alinhamentos”, que se sincronizados e mantidos através dos controles adequados podem trazer um alinhamento efetivo.
A biblioteca ITIL® não oferece uma única disciplina para isso. Na verdade, o alinhamento com o negócio permeia a biblioteca. Mas se pudéssemos eleger uma única disciplina, o gerenciamento de nível de serviço (Service Level Management – SLM) estaria provavelmente em primeiro lugar. E não porque SLM garanta o cumprimento de SLAs (Service Level Agreements). Nada disso. Mas sim, porque SLM garante que acordos sejam feitos e que esses acordos levem em consideração as necessidades de negócio dos clientes. Cumprir ou não SLAs é irrelevante se os acordos não refletirem necessidades reais de negócio.
Mais importante que qualquer outra coisa, SLM depende de uma definição de serviços que de fato ajudem os clientes a atingirem seus objetivos, do alinhamento de expectativas em relação ao que será entregue e da definição de SLAs que realmente façam alguma diferença ao serem cumpridos. Se esses passos fundamentais não forem executados (ou não forem corretamente executados) a monitoração e cumprimento ou não de SLAs será uma mera formalidade contratual. E por consequência, a confecção de relatórios será apenas mais uma forma de gastar papel, tinta ou recursos.
Ao invés de meros SLAs, nada mais relevante para medir a efetividade de SLM do que a confiança que o cliente tem no provedor. A confiança é construída a partir de um relacionamento estabelecido entre cliente e provedor e não a partir de SLAs. Isso se reflete na seguinte pergunta: entre um provedor que cumpriu o SLA e um provedor que não cumpriu, mas que tem um cliente satisfeito e que confia no seu trabalho, quem executou o processo de SLM de forma mais efetiva? A resposta é clara: o último.
Para exemplificar, vamos tomar como exemplo um empresa aérea. As expectativas são altas em relação ao novo serviço de “canal móvel de dados”, que será usado para facilitar a compra de passagens por smartphones. A expectativa é de um aumento em 18% no RPK (Revenue Passenger Kilometers), que representa quilômetros de passageiros pagantes (o que exclui tarifas especiais e tripulantes). Isso significa pelo menos 400.000 passageiros a mais em um único mês para nossa companhia aérea. O sistema também deve alimentar o portal que mostra o ASK (available seat kilometers, que mede a capacidade de transporte) e o load factor (que mede a taxa de ocupação). Duas funcionalidades chave para o negócio são mapeadas: a capacidade de venda de passagens, com um dimensionamento para pelo menos 400.000 transações/mês e a integração com o portal de indicadores. O nível de serviço acordado prevê um baseline de 1000 transações por hora, sendo 500 simultâneas, e pelo menos 1 replicação diária das informações para o portal. A replicação deve ocorrer antes da reunião diária da gerência de operações (10:00 AM). Indisponibilidades do canal devem ser corrigidas em no máximo 1 hora, representando a perda potencial de 1000 passageiros.
Não é difícil perceber o quanto os SLAs acima fazem sentido para os objetivos estratégicos relacionados ao novo canal de vendas. Isso representa um alinhamento entre as necessidades do negócio e os serviços e SLAs oferecidos pela organização de TI. Mas o alinhamento não para por aí. Ele é, na verdade, uma via de mão de dupla e exigirá uma cuidadosa análise tanto da capacidade de entrega quanto dos custos. Essa “ponte” é feita por SLM, que precisa envolver outros gestores como os de disponibilidade, capacidade e financeiro. Depois disso, será preciso monitorar o atingimento dos SLAs, acompanhar perdas potenciais e efetivas e revisar continuamente o valor de negócio que eles representam. Eventualmente, tanto a capacidade do canal ou outra característica poderão ser revistas à luz de novas necessidades de negócio. Os SLAs devem evoluir de forma alinhada a essas necessidades e não podem ser considerados como “gravados em pedra”. Para isso, os próprios acordos devem prever revisões periódicas tanto do atingimento quanto de sua adequação.
Alguns SLAs podem até ser inúteis, mas aqueles criados de acordo com necessidades de negócio específicas, monitorados e revisados continuamente, e usados como ferramentas para a construção de relacionamentos com o cliente, esses sim, são verdadeiros SLAs, tão necessários quanto os próprios serviços prestados.